Depois de se divertir alguns dias a bordo do seu Fórmula 1,
o quadro do Anúbis apresentou piora significativa. Ele já não conseguia mais se
sustentar sentado. Assim como quando ele parou de andar, foi de uma hora para
outra. Eu o colocava sentado e ele caía. Estava paralisado das axilas para
baixo, sem fome e sem vontade de tomar água. Mexia as patinhas dianteiras, mas
não levantava.
Foram dois dias assim, praticamente sem se mexer e comendo
pouco. Como ele não melhorava resolvi
levá-lo a clinica veterinária, na manhã seguinte. Acho que eu protelei dois
dias porque receava receber o diagnóstico final. Na noite anterior dormi na sala, pois levá-lo
para o andar de cima da casa seria muito sacrificado para nós dois. Deixei-o comer tudo que ele gosta: fiz
macarrão com cenoura e brócolis, sachê de carne, queijo branco e dei até um pedaço
de bolo de milho caseiro.
Acordei toda torta na manhã seguinte por ter dormido no
sofá. Lá fomos nós até a clínica veterinária. Havia duas possibilidades de
diagnóstico: a doença ter piorado e comprometido mais áreas da coluna ou ele
estar em uma crise de dor.
Coquetel de remédios
Duas semanas com um coquetel de remédios iriam dizer. No total eram 11 comprimidos por dia, pois
dois remédios precisavam de três doses diárias e ele precisava também de
protetores gástrico e intestinal para aguentar a dose: corticoide e até um
remédio a base de morfina para passar a dor.
Nos primeiros dias ele se animou, comeu bem melhor e tomou
bastante água. Eu o colocava em posição de esfinge para poder comer e beber, e assim
ele ficava. Era a posição que menos comprometia os sistemas respiratório e
cardíaco. Essa fase implicou em uma nova mudança na minha rotina, pois eu
precisaria passar mais vezes em casa, principalmente para dar água para ele.
Foi muito complicado. Se por um lado ele não se arrastava mais pela casa toda
derrubando tudo, por outro eu precisava ficar mais em casa principalmente por
causa da água.
A veterinária deu poucas esperanças de ele voltar a sentar.
Disse que mesmo que isso acontecesse ele ficaria menos bagunceiro. Segundo ela,
a fase de se enganchar nos móveis e rasgar constantemente a fralda era uma
espécie de “revolta”. Que agora ele já estaria se acostumando com a nova
condição.
Música para relaxar
O comportamento do Anúbis oscilou muito nesses dias. Havia
momentos em que ele parecia animado, esticando o pescoço quando eu abria a
porta de casa, enquanto em outros ficava olhando para o nada sem se mexer. Algumas noites ele ficava quietinho enquanto
em outras eu o ouvia mexendo as patas dianteiras tentando ganhar impulso para
levantar, mas sem sucesso.
Para diminuir o tédio, quando saía de casa, passei a deixar
um CD tocando. Ele ganhara da antiga
passeadora um CD chamado “Relaxing Dog”, com músicas especialmente compostas
para a audição canina misturadas com sons da natureza, e que prometia acalmar o
animal. Anúbis parecia gostar.
Se por um lado ele se sujava bem menos e não fazia mais
bagunça, eu precisava estar mais presente.
Preocupavam-me os dias em que eu teria de ir para São Paulo e passar
muitas horas fora. Ele ficaria muito tempo só, principalmente sem tomar água. Mas
a veterinária disse que seu eu garantisse duas boas doses de água por dia, uma
pela manhã e outra à noite ele ficaria minimamente hidratado.
Foram dez dias nessa rotina. Ainda bem que em uma época que
eu pude me ausentar apenas em períodos mais curtos. Mas nem sempre seria assim. No final da primeira semana ele piorou um
pouco. Para ficar em posição de esfinge precisava agora ser ancorado pelas
almofadas. A antiga passeadora emprestou uma almofada em forma de “rolinho” que
eu alinhava com a coluna dele para deixá-la o mais ereta possível, quando ele
estava deitado.
Liguei para a veterinária e ela pediu para levá-lo no fim da
semana seguinte. Não deu tempo de esperar, pois o estado de saúde dele piorou.
No sábado, como ele estava amuado, decidi deixá-lo observando o movimento no
condomínio. Deixei a porta da casa aberta e o coloquei deitado em um edredon em
posição que ele pudesse ver bem a rua, já que moramos em uma casa estilo
americano, sem muros, nem portões.
Cachorros e crianças
Deixava-o sempre com a cabeça em cima de uma almofada alta
para facilitar a respiração e o virava de tempos em tempos. Nem a criançada
brincando na rua, nem outros cachorros passeando pelo condomínio o animaram muito.
As fezes e a urina também mudaram. Fezes
muito escuras, secas e duras como pedras. A urina voltou a ficar presa na
bexiga como nos primeiros dias da doença dele, em janeiro. Mas, dessa vez, não
foi necessária a sonda. Na hora de
trocar a fralda, eu comprimia a bexiga dele até esvaziar.
No domingo a situação piorou, pois ele passou a se
automutilar, talvez por estresse, talvez por dor. O corpo já tinha escaras dos
dois lados e a lambedura foi tão intensa que ultrapassou as camadas de pele
deixando uma mancha em carne viva. Passei óleo de amêndoa nas lambeduras e um
óleo especial nas escaras.
Duas semanas antes eu havia feito uma pequena cirurgia no
rosto e estava usando um óleo especial para cicatrizar sem deixar marcas. Como
o vidro era grande, resolvi dividir o remédio com Anúbis, passando esse mesmo
óleo nas escaras na altura do fêmur. Vi
que não daria para esperar o prazo dado pela veterinária. Resolvi levá-lo
novamente na manhã seguinte.